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  • Foto do escritorMalamanhadas

E as eleições de 2020?

Na história brasileira recente, é comum a rejeição das pessoas em geral a partidos políticos, seja pela presunção de corrupção, por vezes legítima em razão da propaganda que se faz em torno deste problema como o centro do debate político, seja pela ausência de “representatividade” das figuras públicas que vocalizam o programa desses partidos.

Em sua maioria, figuras de velhos, ricos, brancos, supostamente heterossexuais e representantes de grupos empresariais e de seus interesses próprios. Aqui no Piauí não é preciso fazer um grande esforço para lembrar dessas figuras, que são hoje nossos deputados e senadores.

No entanto, Hellcimara Telles (2017), professora e pesquisadora na área da Ciência Política, nos explica que “o partidarismo é relevante para a estabilidade democrática. Ele explica o interesse pela política, a participação eleitoral e a crença na eficácia da democracia. Níveis elevados de apartidarismo e antipartidarismo dão margem ao surgimento de discursos antipolítica e antissistema, o que aumenta a incerteza quanto ao futuro estável das instituições políticas e jurídicas de um país”.

Com todas as críticas que podemos fazer aos limites da democracia, ainda mais considerando que ela nunca existiu efetivamente para pessoas negras, pobres e periféricas, é importante compreender que ela está em construção e sua radicalização é necessária. Os partidos, segundo o próprio nome, enquanto partes da sociedade que, em tese, pensam um projeto político para o país, estado e município, são organizações fundamentais para disputar essa democracia fraca que temos.

E a quem interessa a desmobilização de partidos políticos? Principalmente, partidos de esquerda que participam e engrossam as fileiras da luta, dos movimentos sociais? Afinal, partidos de direita não precisam de tanta mobilização, e sim de dinheiro e dos mesmos velhos, brancos, ricos donos desse dinheiro. Certamente, estes senhores não querem oposição. Para eles, quanto menos partidos para perturbarem a ordem burguesa, supremacista branca, machista e heteronormativa, melhor!

Mas não foram só os partidos políticos afetados por essa desconfiança, capitulada pela direita e por Jair Bolsonaro (até o momento sem partido, não por coincidência). Outras organizações políticas também sofrem com constantes críticas, ataques e ausências de pessoas para construção. Como os sindicatos, por exemplo, que deveriam servir como instrumento de luta para a melhoria das condições de trabalho de todas/os as/os trabalhadoras/es.

Os sindicatos e movimentos sociais sofrem com a premissa de que todo mundo que está lá, construindo essas ferramentas, ou está se aproveitando para atingir seus próprios interesses ou está trabalhando a favor de algum partido ou político específico. De fato, numa sociedade capitalista, os valores individualistas podem estar refletidos em organizações que deveriam ser coletivas. Mas essas ferramentas de luta não são essencialmente, elas estão de acordo com o conteúdo e a finalidade que damos a elas.

Participo de um movimento social de juventude, do movimento feminista e construo um partido político. Essa experiência é positiva, construtiva, educativa, democrática em sua totalidade? Não. Mas, no geral, o desafio de pensar e agir em coletivo e, não somente como indivíduo, é construtivo, educativo e fortalecedor sim. Seria ótimo discutir formas de intervenção sobre a realidade somente comigo mesma ou com pessoas que convergem com boa parte do que penso. Até porque se eu, sozinha, me propuser a transformar as todas injustiças sociais, provavelmente, será uma caminhada de muita frustração. Em coletivo, é possível.

E onde eu quero chegar com tudo isso? Bem, o momento eleitoral está próximo. As eleições não devem nos forçar a pensar somente em quem votar, em quais partidos representam os interesses populares, feministas, antirracistas, LGBTs. Mais importante que isso: as eleições são um momento para nos questionar se podemos contribuir também nesse pensar e agir político permanente. Vale lembrar também que as eleições municipais, aparentemente muito localizadas em questões locais, são um prelúdio das eleições estaduais e nacionais.

O desafio é: onde posso pensar e agir politicamente? É necessariamente num partido político? Não. Pode ser em um coletivo na Universidade, na associação do seu bairro, no sindicato da sua categoria profissional e, por que não, num partido político também? Estamos num momento político que também requer ousadia nas iniciativas. O comum é o individualismo, que corrói quase todos os sentimentos coletivos que temos. Na primeira divergência ou chateação com o coletivo, já tenho motivos suficientes pra sair, desistir e pensar somente comigo mesma.

Mas antes de sequer considerar a ideia de se organizar politicamente ou antes de desistir, lembre-se que é justamente isso que nossos inimigos querem. É isso que os donos do poder querem para continuar mandando, impondo desigualdade, falta de oportunidades, políticas de encarceramento e extermínio. O que eles querem é que estejamos dispersas, divergentes, fragmentadas, sozinhas, buscando um meio de sobreviver individualmente, descolada dos problemas do outro.

Porém, nós não somos indivíduos. Somos comunidade. O problema das mulheres é meu problema. O problema dos trabalhadores uberizados, é meu problema também. O racismo que privilegia brancos e brancas como eu, é principalmente um problema meu. Os abandonos afetivos e materiais que sofrem as pessoas não-heterossexuais, é um problema. E todas essas questões são nossas, de todas pessoas.

Além de votar, precisamos nos organizar sempre na esperança de subverter esses problemas, destruir opressões estruturais. Mesmo nos organizando, ainda descobrimos que somos poucas e poucos. E como conquistar então mais pessoas para a luta? Essa também é parte fundamental de quem está comprometida/o com uma democracia radical e com os direitos humanos. Mas fica para outro texto.

Neste, quero deixar uma mensagem de amor. A mensagem de que somos comunidade política, que nossos problemas não irão se resolver sozinhos. São responsabilidades e compromissos nossos. Pense em quem vai votar, e procure por partidos políticos que vocalizem e pratiquem de forma coerente essa indignação com a injustiça e a desigualdade. Mas pense também no que é possível contribuir em coletivo. Com canta Caetano, “it’s a long way”. A estrada é longa, mas se formos juntas e muitas, lutando por igualdade na medida em que visibilizamos nossas diversidades, percorremos esse caminho longo mais rápido.

Referências

BUENNO, Winnie; BURIGO, Joanna; PINHEIRO-MACHADO, Rosana; SOLANO, Esther. Tem Saída? Ensaios Críticos sobre o Brasil. Editora Zouk: Porto Alegre, 2017.

VELOSO, Caetano. It’s a long way. Londres: Gravadora Phillips, 1972.

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