Quando atravessei o oceano de volta para casa, o mundo estava ausente. A pandemia ocupava todos os lugares. A pandemia também ocupou os meus espaços.
No momento do retorno, o tempo seguia escasso para qualquer coisa. Você deve estar se questionando: se estávamos (e continuamos) em isolamento social, porque a ausência também ocupava o tempo? Explico. É que minha volta foi muito conturbada. Passagens canceladas, voos adiantados inesperadamente, medos exagerados e um coração cheio de conflitos. Devo confessar que minha saúde mental também não estava nada bem. Quarentena não é o meu forte. E acredito que, pelo que estamos vivendo, não é o forte de ninguém. Por isso, repito: o tempo seguia escasso. Não houveram despedidas, nem último adeus, muito menos um acenar com as mãos para a cidade que me salvou durante esses meses. Dei um até logo silencioso à minha condição de imigrante, sem sessão solene, sem rituais celebres. Embarquei apenas com o desejo de chegar no meu lugar salva, sem vírus e com a certeza dessa decisão intacta em mim.
Mas as despedidas e o tempo não foram roubados só de mim. É duro lidar com mortes repentinas sem último adeus. A dor ecoa no vazio dos nossos corações. Bate e volta. Bate e volta. Bate e volta. Até termos a ilusão de que tudo voltou ao normal no mundinho dos sentimentos. Mas sabemos o óbvio e o clichê: nada volta ao normal. E se você anda bradando pelo mundo que estamos vivendo um novo normal, sinto muito lhe dizer que isso é uma loucura.
Nesse tempo de sumiço da escrita, andei pensando sobre dores e sobre o tempo. E o quanto ambas as coisas ando juntas e se acumulam no meio do caos dessa pandemia. Queria deixar alguma frase filosófica que resolvesse todas essas aflições... Mas, minha amiga, não sei ser tão reflexiva. Faço piadas ruins, tenho medos comuns e não sei viver sem certezas. Óbvia demais. Aos poucos, essas minhas características estão escorrendo pelas minhas mãos. Mas isso é conversa para outro dia.
O que queria te dizer é que voltei. Voltei para casa. Para meu lar. Para um lugar seguro. E volto aqui também a escrever para você. De coração aberto e belchior tocando ao amanhecer.
Para ouvir: Comentários a respeito de John.
Ps: sei que você vai lembrar daquela música lá de Roberto Carlos quando ler esse papo sobre voltar. Por isso, deixo aqui a versão que gosto: O portão
Com amor, passarinha.
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