Sempre tive medo de ficar sozinha, quando era criança, mas mesmo assim ficava. Corria pro terraço de casa e ficava um tempo gritando, brincando de eco. E tinha a minha voz que voltava, mas também não tinha mais ninguém.
Não, ninguém. Conforma-te contigo. Maldita mania essa de ficar buscando o tempo todo o olho de algum outro. Talvez eu consiga me ver pelos olhos desse outro.
E tenho ainda parado a vida pra esperar.
É a ilusão infantil que morre só um pouquinho a cada ano, com muita preguiça e teimosia. E sim, tem mesmo umas partes minhas que eu bem queria que estivessem debaixo do chão mas elas ainda demoram pra aterrar. Aí me pego aos 16 anos, criando fantasias de contos de fada com a primeira pessoa que olhou pra mim duas vezes no meio da rua naquele mês.
E aí sim criaríamos vários filhos e teríamos uma varandinha.
Não. Não vem nada de nenhum lugar que se chame "lá fora".
Não tem ninguém vindo a galope, de testa suada e coração aflito vindo me salvar. Não vai ter ninguém pra se fundir comigo e juntos nutrirmos um ao outro por um cordão umbilical invisível. E sendo assim também não serei eu o bebê entregue nas mãos de alguém também e nisso sinto esperança de crescer.
Mas hoje não tem varanda nenhuma. Tem eu aqui. Tem eu limpando a umidade das bochechas, tem uma dor de cabeça e uma dor nas costas bem das oportunistas.
Tem eu. Nem boa nem má. Nem tampouco da realeza. Aliás, minhas ancestrais passavam inclusive bem longe disso. Fico pensando nas angústias das minhas bisavós na minha idade. Tenho imensa vergonha de pedir proteção das minhas ancestrais mas sei que elas me protegem a revelia dos "pobre menina branca" que minha cabeça sarcástica traz à tona de quinze em quinze minutos.
Sigo tentando me proteger de mim mesma, pra ver se paro de brigar comigo e me ganho de volta. Não tem ninguém não tem nada. Mas tem eu tem, eu tem eu e um dia vai ter uma varandinha também. E vai ter eu de novo lá.
E minha fantasia hoje só tem isso pra contar:
Que uma flor desabrochou por dentro do meu peito. E nunca me pergunte como entrou semente ali, mas é fato que: nasceu uma flor de dentro pra fora do meu peito cavando tudo pelo caminho. Rasgou os microvasos e as micropeles e as microvidas por cima desse meu lado esquerdo. Doeu. E a florzinha a muito custo conseguiu sair. Por baixo do sangue que a banhou enquanto nascia, era absolutamente linda. Chorei. Mas ali estava a flor. E foi essa a história de um dos dias em que eu cresci.
Texto escrito por Deborah Falconete.
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