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  • Foto do escritorMalamanhadas

A flor e o jardineiro

Ah, jardineiro! Não deixes o sorriso da tua flor murchar, pois eu te digo, se ele murchar para ti, tu verá a falta que esse sorriso faz. Hoje tu não te importas e não valoriza o perfume que a tua flor te traz, mas, jardineiro, o perfume dela é tão doce que tem outro jardineiro que passa aqui no teu jardim para admirar. E se ele a levar? E se ele a cultivar? Tenho certeza de que uma flor bem regada floresce em qualquer novo jardim, cuidado jardineiro!


- Tu! Flor dependente não merece ser alimentada, então volta a ser semente. Cansei dessa tua marra, esqueces oh linda flor que todo jardineiro rega, cuida, cultiva, mas também corta e poda a praga e, se tu não valorizas quem te cuida como pode cobrar de mim amor e graça? Vai-te embora do meu jardim, flor dependente que só me atrasa. Saibas que a raiz tem que ser profunda, tal qual a beleza das pétalas e da fachada.


- Dei-te a chance de me regar como merecia, não quis saber, achou que era marra ou ironia, estou aqui, em novo jardim, feliz como nunca. Não direi que foi fácil, ou que nos dias de sol alto, eu não senti tua falta, foi árduo, mais o novo jardineiro persistente que era me fez entender que para chegar o verão sempre teremos que vencer o inverno. Às vezes é preciso fazer-se flor, por isso não tenho vergonha de dizer que abri mão dos meus espinhos para deixar toda a delicadeza do meu ser exposta, vulnerável. Sim, sei que deixei minhas pétalas disponíveis para o teu regar só nunca imaginei que um dia toda a beleza do riso fosse se dispersar. Observas já longe o meu novo viridário. Então jardineiro, ainda vês como é possível achar-se noutro lar? Meu riso difuso se deleita com o perfume, percebi que nunca foi marra ou ironia, eram apenas minhas próprias raízes que nem eu mesmo cria. Agora rio como nunca, tão dengosa que mal me lembro do amargor das tuas fugas. Tudo bem, não foi fácil, tem dias que até o sol abrupto faz arder o meu pesar; é que até a luz pode oprimir ou machucar. Mudar é um processo hercúleo, é necessário deixar de se enraizar. Só que dificilmente nos ensinam como desapegar, por isso faz-se essencial vencer as tempestades e o interno inverno. Podada, arrancada, tive que superar meu infértil e triste tédio. Eis que te vejo agonizar, dizer que mal podia se manter, quanto mais me alimentar. Mandou-me retroceder, voltar a ser semente, disse estar esgotado das minhas marras, entediado com as minhas falas, mas acabou grudado nos meus pés videntes. Cuspi na árida terra o teu nome, não esquece que todo jardineiro rega, cuida, cultiva, mas também corta e poda a praga. E junto com as ervas daninhas leva os sonhos, as alegrias e até as fábulas. E para andar comigo só voando na mesma brisa, pois deixei o solo, nunca mais quero estagnar. O que vale a pena tem que te fazer crescer e dominar as adversidades do ar.




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